Mito Climático:
“Uma das principais autoridades canadenses em ursos polares, Mitch Taylor, disse: ‘Estamos vendo um aumento sem precedentes no número de ursos e, nos lugares onde verificamos uma diminuição, esta ocorre devido à caça, e não por causa da mudança climática.’” (Scotsman.com)
Em 2005, o jornal The Scotsman publicou que os ursos polares “desafiavam a extinção”. A afirmação de que a caça é a principal ameaça aos ursos vem sendo repetida por negacionistas ao longo dos anos. Até um negacionista com nome de urso – o dinamarquês Bjorn Lomborg – argumentou, num livro de 2007, que “perdemos 15 ursos por ano para o aquecimento global e 49 para a caça”.
Os ursos polares são encontrados no Círculo Polar Ártico e nas massas de terras circundantes. Existem 19 subpopulações reconhecidas, com um número estimado de indivíduos de 20.000 a 25.000. Ursos polares são classificados como vulneráveis pela União Internacional para a Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais (IUCN) e listados como espécie ameaçada no US Endangered Species Act, a lei de espécies ameaçadas dos EUA. Ainda assim, alguns afirmam que o número de ursos polares aumentou desde 1950 e que tem se mantido estável. Então, qual é a verdadeira situação dessa espécie?
Em primeiro lugar, alguns pontos precisam ser destacados sobre o número de ursos polares:
- Ninguém sabe realmente quantos ursos existiam nas décadas de 1950 e 1960. As estimativas se baseavam em evidências circunstanciais fornecidas por caçadores ou exploradores e não por pesquisas científicas.
- Ursos polares são afetados por vários fatores, incluindo caça, poluição e extração de petróleo. Especialmente a caça, principalmente após a introdução dos snowmobiles, aviões e navios quebra-gelo, levou a um grande declínio de certas subpopulações. A introdução do Acordo Internacional para a Conservação dos Ursos Polares em 1973, o qual restringiu ou baniu a caça em algumas circunstâncias, resultou no aumento do número de ursos polares.
- Nem todas as subpopulações são afetadas no mesmo nível pelas mudanças climáticas, e enquanto algumas subpopulações são bem conhecidas, para outras não existem dados suficientes para se fazer afirmações abrangentes sobre os números atuais ou do passado.
Com isso em mente, o que os números dizem? De acordo com um dado de 2019 do Grupo de Especialistas em Ursos Polares da IUCN, das 19 subpopulações de ursos polares reconhecidas, 4 estão provavelmente em declínio, 2 estão provavelmente crescendo, 5 estão estáveis e sobre as 8 restantes não se tem dados suficientes para tirar quaisquer conclusões.
Tanto a degradação do habitat quanto a caça excessiva são responsáveis pelo declínio de algumas subpopulações. Para entender por que a IUCN e o US Endangered Species Act consideram que os ursos polares estão em risco, é importante ver como o aumento da temperatura poderia afetar seu habitat no futuro. Ursos polares são mamíferos altamente especializados e extremamente dependentes do gelo marinho para se alimentar e para outros aspectos do seu ciclo de vida. Dados de satélite mostram que o gelo marinho do Ártico tem diminuído nos últimos 30 anos, e as projeções mostram que esta tendência vai continuar enquanto as temperaturas continuarem subindo. As mudanças no gelo marinho afetam os ursos polares de várias formas:
- A retração precoce do gelo marinho no verão significa que os ursos têm menos tempo para caçar e, portanto, menos tempo para acumular reservas de gordura.
- A fragmentação e a redução no gelo marinho têm vários impactos. Isso obriga os ursos a nadar grandes distâncias, queimando parte de suas reservas de gordura. Isso também reduz o número de focas, que são a principal fonte de alimento dos ursos polares, e os impede de viajar e de fazer tocas. Assim, os ursos são forçados a passar mais tempo em terra, aumentando a interação com os seres humanos, potencialmente levando a uma maior mortalidade.
Para se ter uma ideia dos potenciais impactos das futuras mudanças climáticas sobre os ursos polares, podemos olhar para as subpopulações encontradas mais ao sul na faixa de ocorrência da espécie, onde as mudanças no habitat tem sido mais perceptíveis até o momento. Um bom exemplo é o da subpopulação do oeste da Baía de Hudson, que é uma das mais bem estudadas. Aqui, a fragmentação dos blocos de gelo está começando mais cedo do que 30 anos atrás, reduzindo efetivamente o período de alimentação em cerca de três semanas. Como resultado, o peso médio das fêmeas caiu cerca de 21% entre 1980 e 2004, e a população diminuiu 22% entre 1987 e 2004. No Alasca, há evidências de aumento da mortalidade de filhotes causada pela diminuição do gelo marinho.
Concluindo, a razão pela qual os ursos polares têm sido classificados como ameaçados resulta dos impactos das futuras mudanças climáticas sobre seu habitat. Hoje a mudança do clima já é um fator importante de declínio de algumas subpopulações da espécie. No futuro, com a eliminação de grande parte de seu habitat, o gelo marinho, os ursos podem necessitar de intervenção humana em grande escala, inclusive alimentação por humanos, para sobreviver na natureza.
Este texto foi adaptado do site Skeptical Science. Leia em português aqui (com tradução de claudiagroposo) e o original em inglês aqui (por Anne-Marie Blackburn).